quinta-feira, 30 de abril de 2020

Toupeira pra todos os gostos

Pessoal do Ancelmo Sempre Ele Gois, cuidado com o exagero de polissilábicas.

Em geral, a preferência por palavras grandes demonstra desconhecimento do idioma, em vez da certamente almejada erudição.

Vejam essa "liberalização" que a assídua colaboradora me enviou. Nesse caso aí, o correto é LIBERAÇÃO, colegas!

Na mesma coluna, o atento amigo tem visto coisas como PIO entre aspas, como se a expressão "não deu um pio" fosse algo novo, ou uma gíria, sei lá

Também deram um nó pra dizer, em bom Português, que a indústria siderúrgica opera com apenas 41% da capacidade instalada — inverteram a ordem e inventaram tanto que a frase ficou sem sentido.

Pra recuperar o humor, eu insisto em ler as sinopses do Amazon Prime.

Hoje achei "uma toupeira perigosa" num departamento de polícia.

A empresa não contrata um profissional e dá nisso: robô é uma toupeira (na nossa língua) e traduz toupeira (mole) literalmente, quando em Inglês seria um "espião", um "agente infiltrado", "alguém que está vazando informações".

segunda-feira, 27 de abril de 2020

Rapidinha antes de dormir

Editores do meu coração, não me matem DE desgosto.

Quando é que vocês vão aprender que, a não ser que a pessoa esteja apaixonada pela covid-19, ninguém morre "por" coronavírus?

Morremos DE infarto, DE doenças variadas, dizem até que morremos DE falência múltipla dos órgãos, vejam só a obviedade.

Morremos DE amores, morremos DE saudades, às vezes morremos NUMA nota preta.

Podemos morrer DE susto e morrer DE medo das coisas mais incríveis.

Morrer POR alguém é possível, assim como morrer PARA o mundo.

E a ignorância também pode matar, mas morre-se DELA, não por ela.

Agora com licença, porque eu estou morrendo DE sono.

sábado, 25 de abril de 2020

Em cima, embaixo, ao redor

Queridos colegas, mais uma vez, obrigada pelo tremendo esforço de reportagem, mas dá pros editores irem um tiquinho além pra não trucidar o idioma?

O uso das preposições está enlouquecido em toda a imprensa.

A assídua colaboradora tem me mandado títulos pavorosos.

Seguem alguns exemplos.

"Repercussões sobre a demissão de Fulano". (Repercutem EM CIMA?)

"Sob coronavírus, Itália comemora (...)". (DEBAIXO do vírus?)

"Mercado volta as atenções ao futuro de Beltrano". (Não voltamos a atenção PARA alguém? Será que mudou?)

Como se não bastasse, eu acabei de ler que o nosso triste país foi "deixado de fora de aliança sobre acesso a tratamentos na OMS". Uau! Aliam-se EM CIMA do acesso e serão tratados DENTRO da OMS?

Basta ler o primeiro parágrafo pra escrever algo inteligível como:

OMS promove aliança mundial para acelerar o tratamento da covid-19 e Brasil fica de fora.

É só uma opção entre muitas que podem explicar o empenho da organização e das lideranças políticas no mundo para encontrar um remédio eficaz.

Para a falta de nexo, a vacina é muita leitura.

PS rápido: parem de dizer que Sicrano fez isso ou aquilo "antes de morrer após ter" um colapso, um infarto, o que for. Dá vontade de esganar o perpetrador.

quinta-feira, 23 de abril de 2020

Morte recebe homenagem?



Gente, para e pensa antes de publicar, por favor!

Vejam o que o amigo e colega friburguense me enviou.

A Globo vai "homenagear a morte" do Ayrton Senna? Acho pouco provável.

Certamente, vão homenagear O PILOTO CELEBRAR sua VIDA e sua carreira no dia do aniversário de sua morte.

HOMENAGEM é uma deferência, uma demonstração de admiração e respeito que se presta a alguém, combinado?

Loucuras da pandemia

Coisas muito loucas têm aparecido nessa quarentena — e não apenas na imprensa, em que hoje a assídua colaboradora achou uma legenda começando assim:

"Oxímetro de pulso é colocado na mão de paciente (...)".

Na foto, há um tremendo close do DEDO com o aparelhinho que mede a PULSAÇÃO (também conhecido como "oxímetro de dedo").

Custa olhar a imagem pra não escrever bobagem desnecessária e confusa?

No Amazon Prime, que tenho fuçado muito nos últimos dias, descubro que as sinopses são traduzidas de qualquer jeito, por algum serviço robotizado da internet.

Robôs não sabem, por exemplo, que em Português fazemos concordância de gênero e somos parcimoniosos com o plural.

Fulana e Beltrana NÃO "entram em comas" devido a um acidente.  Ou as moças saem de um coma e entram em outro, indefinidamente?

Os e-mails também estão uma festa, com promoções como a da Renner, que me pergunta:

"E aquela peça que você não tira o olho?"

Ouviram falar em "DE QUE" ou "DA QUAL"? Não?

Porque "tirar o olho", assim, sem mais, é o que está aí na ilustração.

terça-feira, 21 de abril de 2020

O sujeito da frase

Alô, pessoal da Folha, mais atenção ao sujeito e ao verbo, aquelas coisas que a assídua colaboradora e eu aprendíamos em análise sintática, conhecem?

"O médico foi receitado", gente?!? "O hospital 'receitou' um médico", não INDICOU?

Se a intenção era dizer HOSPITAL RECEITOU REMÉDIO QUE MATOU MÉDICO, é só escrever desse jeitinho aí.

domingo, 19 de abril de 2020

De pedidos e indicações

À minha querida família paulistana — que é também parte carioca, parte mineira — peço cuidado redobrado.

Aos colegas editores, peço o fim do jargão do IML na imprensa.

Gente como a gente morre, não "vai a óbito".

Aproveito pra registrar, pela enésima vez: não existe a regência "pedir para que" isso ou aquilo ou alguém (como o atento amigo tem ouvido direto na TV), ou "nominação" para um cargo (como leu a assídua colaboradora).

PEDIMOS alguma coisa A alguém, como eu fiz acima.

Prefiram "NOMEAR" no lugar de "nominar". Ou "INDICAR". Afinal, esse engano começou com a má tradução dos INDICADOS (nominated) a prêmios.

sexta-feira, 17 de abril de 2020

Tem a ver com 'as calças'?


Perguntar não ofende.

Dito isso, alguém pode me explicar qual é a relação do trem que abre a chamada do Globo com a frase seguinte, que vem depois da vírgula?

O leitor é obrigado ver o colapso no Ceará antes de conferir a situação em outros estados?!?

Se me vir, conjugue direito



Gente, achar o cavalo na imagem é fácil, muito fácil.

Já o bendito futuro do subjuntivo parece ser dificílimo de aprender.

Se alguém VIR o verbo VER conjugado direitinho, mande sinais de fumaça.

quinta-feira, 16 de abril de 2020

A falta que a 'causa' faz

Mais um trem de SP que chega de Minas.

Coberto de razão, o fiel leitor comenta:

"Achei a construção meio estranha. O vírus adia?"

Pois é, colegas. E nem me venham com a desculpa do espaço.

"(...) forem adiadas por/causa da pandemia" cabe perfeitamente no lugar de "(...) 2020 forem adiadas/pelo coronavírus".

Fica até mais equilibrado, com 17 batidas na última linha, em vez de 16.

quarta-feira, 15 de abril de 2020

Não me tirem o sono

Alô, responsáveis pela editoria miscelânea Sociedade: um texto dedicado a acalmar os ânimos dos leitores merece cuidado.

Não consegui passar do primeiro parágrafo dessa redação primária, que começa com pleonasmo (pandemia É epidemia de doença) e, sem as devidas crases, "leva a ansiedade" não sei pra onde.

Desse lugar misterioso, ela "leva a insônia" pra outro canto, no qual eu certamente terei pesadelos "no contexto do coronavírus" e meus "hábitos organizarão uma rotina" que eu CONTINUAREI seguindo, sem sair do lar.

Antes de ir pra cama


Tentei, mas não consigo dormir sem postar essa pérola pescada pelo atento amigo.

A situação esta feiíssima e, por causa dela, tenho relevado muitos atentados ao idioma pátrio.

Mas a bendita "fratura que o rendeu uma internação" foi forte.

De onde o editor tirou essa regência esdrúxula? De algum bom dicionário não foi, eu garanto.

A língua e o Sérgio Ricardo não merecem.

sábado, 11 de abril de 2020

Fala, São Paulo!



Meu muito obrigada à assídua colaboradora e aos colegas da Folha por me fazerem dar uma boa risada — mais necessária que nunca nesses tempos tenebrosos.

A pergunta da amiga foi a cereja do bolo:

"Huumm, 'A cidade falante'... Será uma nova animação da Disney?".


sexta-feira, 10 de abril de 2020

As minúcias dos erros


As três gracinhas foram enviadas pela assídua colaboradora.

O Globo precisa parar de adjetivar o que não deve, como esses "segredos".

Imagino que a intenção fosse dizer que os segredos são contados "em detalhes" (ou MINÚCIAS) na matéria, mas o editor não foi "minucioso" (ou cuidadoso, ou detalhista) o suficiente e escorregou.

Em outro título, copiaram uma regência estropiada, "fugindo a um temporal".

Não adianta pôr entre aspas e não usar o "sic". A gente FOGE DE um temporal.

A segunda regência estropiada está no Comunique-se, portal feito por e para jornalistas que deviam estar carecas de saber que não se "processa de" coisa alguma.

Só se isso for um "processamento de dados".

segunda-feira, 6 de abril de 2020

A imprensa 'performática'

Colegas da Folha, não basta ressaltar "o estudo sobre o efeito do (...) e seus efeitos sobre o", tem que "performar"?

A assídua colaboradora e eu não gostamos dessas modinhas tolas.

Tudo bem que a língua é viva, mas temos várias alternativas para o horroroso neologismo, que demonstra falta de conhecimento do idioma pátrio e nasceu em textos pessimamente traduzidos.

Que tal dizer "teve melhor desempenho", "mostrou-se mais eficaz", "teve melhor resultado" etc. etc.?

Não faltam opções em bom Português.

sexta-feira, 3 de abril de 2020

Ah, essas paixões desenfreadas...

Pra vocês, mais um trem que veio de Minas (embora a notícia seja de São Paulo).

O pessoal do G1 pode explicar pra gente se o piloto estava apaixonado pelo Corona e "morria-se por" ele? 

Ou o coronavírus é uma "causa pela qual vale a pena morrer"?

Em caso de doença, colegas, MORREMOS DISSO ou DAQUILO, tá?

E NÃO MANDAMOS mensagem do ALÉM, até prova em contrário. 

quinta-feira, 2 de abril de 2020

Um após após o outro

Caros colegas, ajudem a deixar nossa quarentena mais leve, por favor.

Especialmente num site dedicado a "celebridades" e futilidades em geral (quem lê essas coisas quer se distrair, imagino).

O trem veio ontem de Minas, mas só hoje eu vi nas minhas mensagens.

Acho que dispensa comentários.

Pra não dizer que não falei de...

Sobre aquela história de a imprensa chamar a praga que nos assola de "novo coronavírus", até Dorrit Harazim comentou o tema em sua coluna de domingo.

Todos no mesmo barco
Brasil tem no comando um fio desencapado
29/03/2020

É falsa a ilusão de que à atual perda de liberdade por quem está em isolamento corresponde uma súbita fartura de tempo — commodity que ontem como agora vale uma fortuna e é disputada por ilusionistas de todos os tipos. Alguns mercadores ainda teimam em infiltrar nosso confinamento com oferendas bizarras como “Fashion Trends: Metalizados para o Inverno 2020”. Ou “Saldão de Vinhos Grand Cru, Só Até Amanhã!”. Que amanhã?? Os robôs da rede social Linkedin, que já foi comparada a uma escadaria Escher travestida de degrau de ascensão profissional, continuam a informar promoções individuais e de aniversários em empregos. Que empregos??

Confinados ou não, nos sobra pouco tempo para qualquer coisa que não seja relacionada ao coronavírus — o qual, por sinal, dispensa o qualificativo de “novo” por já ter nome e sobrenome de doença (Covid-19). Em compensação o adjetivo é mais atual do que nunca no conceito de “novo-pobre” delineado pelo economista Ricardo Paes de Barros, que há dias prega políticas sociais imediatas, coerentes e sustentadas para as periferias urbanas. Na nave chamada Brasília a urgência é outra.

Enfiados em nossos casulos de ocasião, a fartura de tempo é ilusória. É preciso digerir os prós e contras do medicamento hidroxicloroquina, ora anunciada como medicamento redentor, ora noticiada como tendo provocado mortes na Nigéria. Também precisamos nos atualizar sobre o significado de anosmia (perda de olfato) e ageusia (perda de paladar), citados como eventuais sintomas paralelos do coronavírus. O noticiário global se mescla ao nacional e ao local, com todos ameaçados pelo mesmo vírus. A doença não distingue entre o pulmão do príncipe herdeiro do Reino Unido e os 1,3 bilhão de pulmões de indianos quarentenados por ordem do governo. A morte tampouco faz distinção entre bípedes — ela é o maior equalizador social que conhecemos, talvez o único. É em vida que sociedades fazem suas escolhas de convívio ou exclusão, que os governantes por ela escolhidos tomam decisões de seleção das espécies.

Por fatalidade, para guiá-lo na travessia dessa peste moderna de proporções ainda incertas, o Brasil tem no comando um fio desencapado. Irresponsável nos atos, celerado nas palavras e perigoso no que pensa. Desacredita nos números de mortos da pandemia em São Paulo e nos Estados Unidos por não lhe convirem politicamente, enquanto manifesta a crença de que “brasileiro não pega nada... o cara sai pulando em esgoto, mergulha, e não acontece nada...” Ou seja, esse brasileirinho safo já nasce com vacina própria: por sobreviver sendo preto ou pardo, pobre e favelado, tem os anticorpos necessários contra uma mera Covid-19. Assunto resolvido.

A semana se encerra com o número de infectados globais embicando para além dos 600 mil. Mesmo assim, em meio à torrente de gráficos, dados e estatísticas ininterruptamente atualizados, nos apegamos a histórias individuais, notícias de algum caso específico que nos toca. Felizmente, somos uma espécie social em comunicação voraz mas ainda capaz de sentir a dor e a alegria do outro.

De certa forma, neste início de 2020, nosso planetinha se parece um pouco com a sina do cruzeiro Zaandam, que zarpou de Buenos Aires no início do mês, e aguarda permissão para atravessar o Canal do Panamá e seguir rumo a algum porto disposto a abrigá-lo. Seus 1.243 passageiros foram informados pelo comandante que há quatro mortos a bordo, vítimas da pandemia. Imagine-se as incertezas da viagem até o navio atracar em seu ponto final. No mundo em terra firme não é diferente. Em ambos confiança e coesão coletiva dependem, em boa parte, da capacidade de seus comandantes.

Diante da orfandade nacional neste quesito, cabe a cada um escolher seus conselheiros. Gera conforto ver emergir uma figura serena, clara e objetiva, que tem falado de forma incansável para um Brasil adulto: Margareth Dalcomo, pneumologista e pesquisadora da Fiocruz, sem agenda política para defender. Defende a ciência, o saber, a informação.

De resto, se sobrar tempo, vale mergulhar no recém-lançado “Por que o tempo voa”, de Alan Burdick (Todavia). Ou então resignar-se à constatação formulada por John Updike em suas “Memórias”: “A cada novo dia acordamos ligeiramente alterados, e a pessoa que éramos ontem já não é mais. Portanto, por que ter medo da morte quando ela ocorre o tempo todo?”